Alguns meses atrás escrevi aqui sobre a necessidade de inovação nas abordagens para a educação em saúde. Nesse artigo eu comentei sobre mudança no contexto de aprendizagem para fora da sala de aula e dentro do contexto de desempenho (aprendizagem baseado em ação, por exemplo). Gostaria de enfatizar algumas outras mudanças estruturais que irão desempenhar um importante papel na melhoria da educação em saúde no futuro próximo

Em seu livro “Inovação na Gestão de Saude” Clayton M. Christensen, Jerome Grossman e Jason Hwang tem um capítulo inteiro dedicado ao “O Futuro da Educação em Saúde”. Neste capítulo eles se concentram na necessidade de mudar a faculdade de medicina. A arquitetura da escola de medicina atual foi criada há mais de cem anos atrás, e ainda é seguida por quase todas as escolas de medicina aqui no Brasil. O design desta educação seguiu basicamente três elementos. Em primeiro lugar há dois anos de ciências básicas. Isto é seguido por uma ciência aplicada adicional, e, finalmente, um estágio. Este modelo fragmentado faz a integração entre teoria e prática ser extremamente difícil, quase garantindo que a teoria será esquecidaaté o momento em que o aluno a aplicará. Há uma grande necessidade de ir além da separação entre teoria e prática e passar para uma abordagem mais unificada.

Os profissionais na área de saúde hoje em dia precisam colaborar dentro de um sistema cada vez mais complexo. Porem o currículo médico (de cem anos atrás) enfatiza a tomada de decisão de forma autónoma. Hoje, para o profissional de saúde ter sucesso ele tem que aprender a trabalhar de forma colaborativa e não tomar decisões isoladas do resto do sistema. Na saúde moderna, as decisões tem que incluir outros papéis e tecnologias como elementos tão importantes quanto a experiência do médico.

A educação médica tem que cada vez mais ajudar o médico a trabalhar em parcerias. Médicos também precisam aprender trabalhar diretamente com as tecnologias em diagnóstico e terapia.  Porem as atuais abordagens de ensino médico no Brasil estão ainda baseadas na intuição do médico. Pior ainda são as organizações que representam os médicos que resistem aos esforços importantes para capacitar trabalho em parceria, por exemplo, reconhecendo papéis importantes como o dos profissionais de enfermagem e outros profissionais técnicos. Organizações como o Conselho Regional de Medicina (CRM) deveriam estar envergonhados de suas práticas vergonhosas de resistir aos esforços para dar mais potência e um papel maior aos enfermeiros, técnicos ou outros profissionais.

No entanto, mesmo com os maus exemplos, como o do CRM, há também alguns bons exemplos no Brasil. A organização filantrópica Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein (SBIBAE), iniciou recentemente um programa de formação de médicos baseado no Team Based Learning (TBL). O programa é verdadeiramente único para o Brasil, e irá definir o padrão que outras instituições como as escolas de medicina de universidades públicas vão precisar seguir. A diferença começa no início, na própria seleção dos candidatos. O programa já se tornou a escola de medicina mais competitiva do país com mais de 11.000 aplicações para apenas 50 lugares. No entanto, em vez de usar testes padronizados para selecionar seus candidatos cobiçados, foi usada uma série de mini-simulações. Muitas destas mini-simulações não tinham relação com a medicina em si, mas com como os candidatos trabalhavam com outras pessoas dentro de um sistema em um determinado conjunto de circunstâncias. Por exemplo, em uma simulação o candidato deve decidir como entregar a notícia de uma doença na família a um colega de faculdade. Depois de mais de trinta destas mini-simulações, o caráter subjacente, capacidades de trabalho em equipe, disposição para colaboração, inteligência emocional e empatia do candidato são revelados em condições realistas. Compare isso com a outra escola médica no Brasil, onde a sua capacidade de “passar no teste” é o fator determinante para ganhar um ponto. No SBIBAE é a sua capacidade de cooperar, empatia, ajudar os outros e desenvolver uma visão sistêmica que contam.

E as diferenças só começam aqui. Uma vez admitido o estudante começará uma abordagem totalmente nova para a aprendizagem. Os alunos não tem aulas. Em vez disso, o conteúdo é entregue através de uma plataforma de aprendizagem social que inclui vídeos, artigos, exercícios, etc. O conteúdo tem que ser trabalhado antes de entrar na sala de aula. A sala de aula, em seguida, assume um novo significado. Em vez de ser o lugar onde a informação é adquirida, a sala de aula torna-se o lugar onde as equipes trabalham em conjunto para resolver problemas, aplicar conceitos, e aprender interações baseadas em equipe. Além disso, a cada quatro semanas as equipes e os indivíduos avaliam-se em um sistema robusto de avaliação. Ao longo dos seis anos do curso, se desenvolve um portfolio muito robusto de avaliação formativa. Há muito a ser aprendido com a abordagem da SBIBAE.

Há também muito potencial para futuras inovações. Uma nova plataforma para micro-certificação de competências, chamada de “Badges Digitais”, que produz microcertificações que atestam domínio de habilidades específicas tem grande potencial disruptivo para educação em saúde no Brasil. Nos Estados Unidos, a organização Badge Alliance trabalha pela popularização do open badge, um distintivo ou medalha digital que comprova o aprendizado. Em vez de confiar em provas tradicionais, estes emblemas digitais com rubricas apropriadas medem o desempenho de competências dentro do contexto real de performance complementando informações dos currículos tradicionais. Badges permitirá que indivíduos, equipes e organizações visualizem claramente as lacunas de competências, mantenham e acompanhem o desenvolvimento de competências. Inovação como “Badges” terão um papel importante na inovação em educação de saúde no Brasil.

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